Residentes da Ufam discutem casos por videoconferência entre Borba e Manaus

No encontro de quinta-feira, 10, a discussão foi sobre o caso de pessoas da etnia Mura, inclusive partindo de uma abordagem antropológica das temáticas de incesto e gravidez

O quinto encontro virtual entre os residentes de Borba e os professores e residentes de Manaus foi na quinta-feira, 10O quinto encontro virtual entre os residentes de Borba e os professores e residentes de Manaus foi na quinta-feira, 10Por Cristiane Souza
Equipe Ascom Ufam

Selecionados para a Residência Geral em Medicina de Família e Comunidade, os médicos Eugênio Queiroz e Cleise Pinheiro são os primeiros a atuar no interior. Eles fazem parte da experiência pioneira do Programa de Residência do Hospital Universitário Getúlio Vargas (HUGV) que passou a fazer uso da tecnologia de videoconferência para a realização de aulas e estudos de caso. Na tarde de quinta-feira, 10, ocorreu o quinto encontro virtual da turma, transmitido entre Borba, município localizado a 155 km de Manaus em linha reta, e a capital amazonense.

A exibição realizou-se na sala de videoconferência da Gerência Multiprofissional em Telemedicina da Universidade Federal do Amazonas (GMTS/Ufam), localizada na Faculdade de Medicina. A professora Naila Feichas, médica da Secretaria Municipal de Saúde de Manaus (Semsa) e docente voluntária da Comissão de Residência Médica do HU, intermediou a apresentação do residente Eugênio Queiroz. Ele apresentou pesquisa sobre incesto e gravidez entre Muras que residem no município de Borba.

Família e Comunidade

Conforme a professora Naila Feichas, a medicina geral de família e comunidade trabalha com a atenção primária. “São os médicos que estão nos postos e nas unidades básicas de saúde, são a porta de entrada para a população e cuidam dessas famílias, independentemente da faixa etária. Acompanham crianças, gestantes, idosos, pessoas em qualquer fase da vida”, disse.

Tal formação se concretiza pelo cuidado longitudinal¹, sendo possível acompanhar os pacientes durante anos, caso o médico permaneça na mesma unidade. “Fazemos visitas domiciliares, atividades nas escolas, nas igrejas; isso porque não tratamos somente a doença, mas a saúde dessa comunidade”, destacou a médica Feichas.

Ainda segundo ela, a residência existe pra suprir uma deficiência da maior parte das universidades do País. “Nós vamos qualificar esses profissionais para atuarem na atenção primária. No curso, trabalhamos a questão dos vínculos, da longitudinalidade, o papel do SUS. A abordagem centra na pessoa, na comunidade, inclusive pela avaliação dos problemas sociais”, explicou a docente.

Fortalecer a atenção primária, seja na capital ou no interior, é o caminho para reduzir a probabilidade de piora do paciente em situação crônica, evitando a sobrecarda da emergência e da atenção secundária. É esse o nosso propósito do médico generalista em família e comunidade, o qual, para além do próprio atendimento, forma um vínculo com as pessoas.

Beneficiar o interior

Em 13 anos, pela primeira vez o curso é extensivo aos residentes que atuam no interior do Amazonas, em locais onde há efetiva carência de profissionais. “Estamos levando o curso para os médicos que estão em municípios mais distantes, que não tiveram a oportunidade de fazer residência aqui na capital”, justificou a professora Feichas. O ganho, segundo ela, é para os residentes, para as instituições envolvidas e, principalmente, para a comunidade.

Médica Naila Feichas é docente da residência no HUGVMédica Naila Feichas é docente da residência no HUGV“Um dos municípios que sentiu necessidade e nos procurou foi o de Borba. Diante do interesse, assumimos a primeira tentativa agora”, lembrou a professora. Já na quinta atividade por videoconferência (com transmissão semanal), o programa também inclui treinamentos presenciais, tanto com a ida de professores para o município quanto com o deslocamento dos residentes para Manaus. Ao todo, a residência dura dois anos.

Em debate

No encontro de quinta-feira, 10, a discussão foi sobre o caso de pessoas da etnia Mura, inclusive partindo de uma abordagem antropológica das temáticas de incesto e gravidez. O residente Eugênio Queiroz apresentou investigação realizada em Borba. Por meio de entrevistas, ele concluiu que o fato de os pais engravidarem as filhas não se trata de um aspecto cultural, embora observada a incidência entre os Mura daquela localidade.

“Isso não é da cultura daquele povo, mas eles encobrem para não causar ‘confusão’ na comunidade”, constatou o médico. Eugênio contou ainda que é bastante comum haver relação entre primos de primeiro grau, tio e sobrinha, tia e sobrinho e entre a esposa de um dos irmãos com o outro. “Nesse último caso, um dos irmãos empresta a esposa para o outro. Ou seja, essa é uma decisão do marido, e não dela”, esclareceu o residente.

Segundo ele, são recorrentes os casos crianças que nascem com má-formação óssea ou deficiência mental, por exemplo. “Num caso que eu atendi em 2014, a criança deficiente era beneficiária da assistência social”, informou o médico. Além dele e da residente Cleise Pinheiro, ambos em Borba, a residente Fabíola Santos atua em Manaus com medicina de família e comunidade.

GMTS Ufam

Na avaliação da gerente da GMTS Ufam e da Telessaúde do HUGV, enfermeira Adriany Araújo, o recurso de videoconferência tem o potencial de ser utilizado em grande escala tanto no meio acadêmico quanto no âmbito da atuação profissional, para favorecer o intercâmbio de conhecimento que independe de limites geográficos. “Em relação ao interior, muitas vezes existe essa dificuldade de deslocamento para a realização de aulas e palestras”, enfatizou.

“O que nós já temos aqui começa a ser explorado em experiências acadêmicas. No ano passado, por exemplo, tivemos a atuação do polo de Coari, durante a Fientec”, destacou, ao informar que houve a ministração de aulas e cursos aos participantes do evento.

O ambiente virtual é utilizado pela Unidade de Telessaúde do HUGV e para as atividades da GMTS. Segundo informa a gestora, outros espaços também têm sido utilizados para as transmissões, conforme houver demanda. Atualmente, dois equipamentos de videoconferência modernos estão em uso, e um deles foi instalado no auditório da Faculdade de Medicina Doutor Zerbini, onde ocorrem as transmissões da residência multiprofissional.

¹ Longitudinalidade: é o acompanhamento da pessoa ao longo dos anos, diferente de quando se atua no CTI ou na emergência, onde se atende o paciente por alguns momentos até que ele tenha alta. Esse médico acompanha o paciente no dia a dia.

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