Físicos têm profissão regulamentada no Brasil
Considerada a ciência fundamental, a Física contribuiu para o desenvolvimento de toda a tecnologia moderna. Como profissão, ela foi a paixão de nomes como Arquimedes, Tales de Mileto, Isaac Newton, Albert Einstein, Marie Curie e Stephen Hawking. No Brasil, a profissão foi reconhecida no último dia 10 de julho, quando foi promulgada a Lei nº 13.691, que regulamenta o exercício no país.
Pela Lei, graduados em Física podem, entre outras atribuições, “elaborar documentação técnica e científica, realizar perícias, emitir e assinar laudos técnicos e pareceres, organizar procedimentos operacionais, de segurança, de radioproteção, de análise de impacto ambiental, redigir documentação instrumental e de aplicativos no que couber sua qualificação;” uma das principais demandas dos profissionais.
Com a medida, cria-se a reserva de mercado para os profissionais, o que antes não existia, restando àqueles, principalmente bacharéis, concorrer em desvantagem com profissionais de outras áreas. De acordo com o coordenador do curso de licenciatura em Física da Ufam, professor Walter Castro Júnior, o reconhecimento era uma demanda antiga dos graduados, que buscavam mais oportunidades no mercado de trabalho.
“Essa luta não é de hoje. A própria SBF, criada em 1966, já vem engajada nessa luta há muitos anos, mas a comunidade dos físicos era dividida quanto a isso. Físicos que atuam em física médica e geofísica, por exemplo, mesmo com mestrado e doutorado, não podiam emitir um laudo porque a profissão não era regulamentada, perdendo chances para outras profissões. Agora, eles têm esse direito, eles podem também pleitear vagas nessas áreas no mercado de trabalho privado”, comentou professor.
Segundo o coordenador, a regulamentação traz impactos positivos tanto para licenciados quanto para bacharéis, uma vez que atinge ambos de diferentes formas. Para os primeiros, a Lei garante o exercício profissional nas escolas públicas e particulares de todo o país. A Física, como conteúdo escolar pode ser ensinada por pessoas de outras áreas. “O Brasil precisa hoje de mais de 50 mil professores de Física. Têm 50 mil pessoas dando aula de Física em instituições de ensino médio, públicas e privadas, que não são licenciados em Física, são engenheiros, matemáticos, químicos. Nada contra, mas eles não têm a bagagem de conhecimento da Física que um físico tem. E isso por falta da regulamentação”, revelou.
“Essa questão da regulamentação é importante para os físicos que vão atuar no mercado de trabalho fora das instituições de ensino e pesquisa. Não é uma parcela muito grande, mas o Brasil tem formado uma significativa quantidade de doutores em Física na última década que não encontrarão campo na academia e, com certeza, existem vários profissionais, que por não ser uma profissão regulamentada, não atuam em igualdade no mercado de trabalho com aquelas profissões regulamentadas”, disse o coordenador sobre os bacharelados na área.
Conselho de Física
Com o reconhecimento da profissão, será criado o Conselho Federal de Física responsável por, entre outras ações, fiscalizar o exercício profissional no território nacional. “Agora o Conselho Federal de Física vai regulamentar as pessoas que já estão na área e aos futuros profissionais e, mais ainda, vai garantir à sociedade a segurança do exercício da profissão. Como toda profissão regulamentada, a medicina, por exemplo, o mau médico pode ter o registro caçado, como Física não tinha isso, com um mau físico não acontecia nada. Então, nesse aspecto, eu vejo com bons olhos a regulamentação”, explicou o professor Castro Jr.
Segundo a SBF, a inscrição no Conselho de classe não será necessária para docentes e pesquisadores. “Eu espero que, com a criação do Conselho, nos concursos futuros para professor de Física, principalmente do Estado, não possam concorrer gente de outra área”, expôs o coordenador da licenciatura da Ufam.
A ciência que revela os segredos do universo
“O físico é aquela pessoa que se encanta em entender como a natureza funciona, como as leis básicas do universo regem o comportamento desde dentro do átomo até a estrutura de grande escala do universo. Então, eu me encantei com isso”, diz o professor Walter Castro Jr.
Este também é o caso de Victor Roza, 18 anos, estudante do primeiro período de licenciatura em Física, que optou pela área por influência de professores da educação básica que apresentaram o mundo sob o olhar das leis da Física, despertando em Victor o desejo por conhecer mais. “Eu sempre quis entender como era o mundo e os professores de Física que eu tive a maioria era muito “apaixonante”. Por isso, eu escolhi licenciatura porque um professor, quando bem instruído e quando instrui bem seus alunos, ele pode mudar uma vida”, expõe Victor.
Bastante criticado pela opção feita, Victor mostra convicção ao defender a Física como responsável por importantes avanços na ciência e para a humanidade. “Graças à Marie Curie, que descobriu o rádio [elemento químico], a gente tem aqui no Brasil o tratamento contra o câncer”, cita. “Tem várias formas de a Física fazer o Brasil crescer, e ele é muito rico ainda mais em carbono e nióbio. Falta só investir e essa regulamentação vai potencializar tudo isso”, avalia.
A formação em Física
De acordo com o relatório realizado pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos a pedido da SBF, publicado em 2012, “a Física exerce papel central nos programas prioritários da Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação do governo brasileiro e tem potencial para contribuir para a inovação e aumento de competitividade dos setores industrial e empresarial do país”.
Mas para ajudar no desenvolvimento do país, a Física precisa superar questões que vão além da regulamentação. No Amazonas, a formação acadêmica na área, por exemplo, enfrenta desafios que vão desde o ingresso até a conclusão do curso de graduação, seja ele bacharelado ou licenciatura.
De acordo com o coordenador do curso, a falta de conhecimento da profissão e a baixa nota de corte no Enem/Sisu são alguns dos fatores que levam muitos candidatos a optarem pela graduação na área. “A gente percebe que muitos dos alunos que entram no curso, entram porque foi o que a pontuação permitiu. São alunos sem vocação e que na primeira oportunidade mudam de curso e nós não podemos fazer nada, ainda que a gente mostre o grande campo de trabalho para os nossos alunos, existem aqueles que usam o curso como estratégia para migrar para outros”, declara o professor Walter Castro Júnior. “Parte da dificuldade em Física vem do Português. Parte dos alunos leem os problemas, mas não sabem o que leem”, acrescenta.
A implantação do novo projeto pedagógico do curso e a criação de um curso de nivelamento realizado durante os primeiros semestres da graduação são estratégias para alcançar maior êxito na formação de físicos. “Em agosto, o projeto segue para a Câmara de Ensino para que seja aprovado. Esperamos que as turmas de 2019 já entrem com o novo projeto”, finaliza o coordenador do curso.