Pesquisadoras destacam Dia da Mulher como oportunidade de fortalecer a luta por mais projeção

Professoras Iraildes Caldas, Ivânia Vieira e Lidiany Cavalcante têm produções voltadas às temáticas de gênero, cidadania e suas manifestações em diferentes contextos.

Professora Iraildes Caldas considera a maior participação feminina no Parlamento como a conquista mais urgente a ser obtida pelas mulheres. "A política no Brasil é feita para o homem. Precisamos mudar isso urgentemente", declarou a pesquisadoraProfessora Iraildes Caldas considera a maior participação feminina no Parlamento como a conquista mais urgente a ser obtida pelas mulheres. "A política no Brasil é feita para o homem. Precisamos mudar isso urgentemente", declarou a pesquisadora

 
Por Cristiane Souza e Márcia Grana
Equipe Ascom Ufam

Mais do que um dia em que as mulheres são agraciadas com mensagens e presentes, o 8 de março é uma data dedicada à luta feminina. A Universidade Federal do Amazonas (Ufam) destaca a trajetória acadêmica de mulheres que se dedicam à pesquisa e à produção de conhecimentos capazes de transformar a realidade de muitas outras.

Com vasta produção intelectual nas áreas de Sociologia, Antropologia, Etnologia Indígena e Serviço Social, atuando principalmente nos temas de gênero e manifestações simbólicas, a coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Sociedade e Cultura na Amazônia da Universidade Federal do Amazonas (PPGSCA/Ufam), professora Iraildes Caldas, destaca o Dia Internacional da Mulher como marco do processo de construção de direitos das mulheres. “As mulheres precisam de reconhecimento. Estamos passando por um momento muito delicado na política brasileira, que é a retirada dos direitos das mulheres, direitos esses que foram conquistados arduamente ao longo da história. A retirada das leis de amparo ao trabalhador, por exemplo, atingiu a todos, mas mais fortemente as mulheres. Se antes o mercado já era difícil para elas, com o desamparo trabalhista, acabam ficando na vulnerabilidade. Então, as mulheres precisam, além de manter direitos, reconquistar aqueles que foram retirados e serem reconhecidas como sujeitos protagônicos dentro da sociedade brasileira”, avalia a pesquisadora, que aproveita para indicar as obras “As mulheres e o Poder na Amazônia”, de autoria da professora Heloísa Lara da Costa e "As novas amazônidas”, de sua autoria, como os principais estudos demarcatórios da presença de gênero na ciência do Amazonas.

Maior participação feminina na política

Caldas afirmou também que a participação feminina no Parlamento  é a conquista mais urgente a ser alcançada. “Temos um parlamento brasileiro muito deficitário de mulheres, um parlamento com um sistema político que as exclui. As mulheres concorrem de maneira muito desigual com os homens dentro dos partidos políticos, em virtude de a nossa política ser muito androcêntrica, feita para o homem e precisamos mudar isso urgentemente”.

Memória de lutas

 "O 8 de março não é dia de homenagem como está convencionada a palavra na maioria dos dicionários. É dia de luta. É o tempo de reafirmação da memória de lutas das mulheres no mundo", afirma a professora Ivânia Vieira "O 8 de março não é dia de homenagem como está convencionada a palavra na maioria dos dicionários. É dia de luta. É o tempo de reafirmação da memória de lutas das mulheres no mundo", afirma a professora Ivânia VieiraMestre e doutora em Sociedade e Cultura na Amazônia, autora das pesquisas “O discurso operário e o espaço da fala da mulher”, no mestrado, e “Lugar de mulher: a participação da Indígena nos Movimentos Feministas e Indígenas do Estado do Amazonas”, no doutorado, a professora do Departamento de Comunicação Social, jornalista Ivânia Vieira, ressalta o dia 8 de março como tempo de reafirmação da memória de lutas das mulheres no mundo. “Resistimos à morte decretada nas diferentes formas de governos ditatoriais, autoritários, nas invenções igualmente perversas do neoliberalismo, na desconstrução da democracia e no esforço do poder no mundo para esmagar a possibilidade socialista da vida. Na Amazônia, a luta das mulheres é árdua por direitos negados historicamente; na defesa do elo gente/natureza e contra os projetos que aniquilam a vida em comunidade, os povos, a floresta, a água, e aparecem como triunfo do capitalismo”.

“As mulheres da Amazônia estão em luta para enfrentar a ciência elitista que as enxerga como meros objetos de estudos dos modelos colonizantes; estão em luta para salvar o rio, o igarapé, o lago, a árvore, as aves, os peixes; para defender as etnias, o direito a religiosidade de cada pessoa e de cada povo, à orientação sexual; pela saúde, a moradia e o transporte dignos; pelo direito de escrever novas narrativas e de entrar pela porta da frente da academia com marca de respeito aos seus saberes e conhecimentos produzidos. As mulheres em luta constroem outra noção de academia e propõem novos paradigmas”, acrescenta a docente, que ressalta as lutas femininas ao longo de sua produção acadêmica.

Lutas de caráter coletivo

Ela também destaca o caráter coletivo da luta das mulheres. “Em suas lutas entrelaçadas, as mulheres carregam as crianças, os adolescentes, as juventudes e os idosos. Basta olhar com atenção a pauta de lutas e os lugares de encontros das mulheres para identificar que elas nunca brigam por algo isolado. São coletivas e fazedoras de alianças. O respeito às mulheres não virá na homenagem dicionarizada, parte de uma gramática da dominação. Ele é e será resultado das conquistas protagonizadas por elas em suas diferenças e singularidades em permanente processo de enfrentamento por autonomia, liberdade, pela manutenção e construção de alianças reconciliadoras da espécie humana com a Natureza, avó e mãe”, ressalta a professora.  

Gênero - campo importante para o diálogo acadêmico

Professora Lidiany Cavalcante elegeu,  em suas investigações acadêmicas, os temas gênero, diversidade, identidade e sexualidadeProfessora Lidiany Cavalcante elegeu, em suas investigações acadêmicas, os temas gênero, diversidade, identidade e sexualidadeAssistente social, a professora Lidiany Cavalcante é mestre em Serviço Social e Sustentabilidade na Amazônia pela Ufam e doutora em Sociedade e Cultura da Amazônia, também pela Instituição. Em suas investigações acadêmicas, elegeu como temas gênero, diversidade, identidade e sexualidade.

“Trata-se de um campo importante para o diálogo acadêmico, visto que temos uma diversidade de pessoas. São ‘Identidades’ diferentes, são modos de viver e expressar as suas sexualidades que denotam formas de reconhecimento no âmbito da diversidade”, salienta, ela, para quem os constructos em torno dos gêneros, historicamente, levaram a tecer reflexões apenas acerca do universo masculino versus feminino, preferencialmente de um viés conhecido como heteronormativo, ou seja, a partir do qual as relações e as reproduções sociais estão pautadas no contexto da heterossexualidade como norma.

“Os sujeitos sociais não podem ser envoltos num padrão, tampouco expressar apenas uma forma de pensar, de agir e de se manifestar. Outras expressões precisam ser consideradas, incluindo nesse bojo, as expressões das sexualidades humanas”, completa a pesquisadora.

Ao analisar os avanços sociais possibilitados pela pesquisa acadêmica, a professora Cavalcante concorda que existem mudanças no que tange às políticas públicas para mulheres em vários contextos, seja na assistência às mulheres vitimizadas, na saúde, na inclusão, entre outros. “Apesar disso, o Brasil é um País de tradição patriarcal, por vezes misógino e preconceituoso. Ser mulher ainda é um desafio na sociedade contemporânea”, observa.

“Os avanços das políticas são importantes, mas precisamos ainda de um processo de desconstrução cultural, em que a mulher tenha maior visibilidade e mais oportunidades. Se ser mulher é um desafio, mesmo frente à sociedade contemporânea, imagine a realidade cotidiana das mulheres  lésbicas, bissexuais e transexuais, as quais, diante dos elementos de segregação e discriminação, acabam envolvidas num processo de ostracismo social, político e cultural, em uma sociedade que ainda as considera como transgresssoras”, avalia a docente.

Para ela, ao mesmo tempo em que algumas políticas de identidade têm avançado no sentido de se efetivarem, ainda não há inclusão social e são deixadas de lado várias expressões de reconhecimento. “Tratamos também de sujeitos humanos, com os mesmos direitos diante de uma sociedade em transformação”, finaliza a professora Lidiany Cavalcante. Como mensagem pelo dia ‘8 de março’, ela cita Simone de Beauvoir: “Que nada nos defina, que nada nos sujeite. Que a liberdade seja a nossa própria substância, já que viver é ser livre."

Confira lista de obras indicadas pelas entrevistadas
para refletir sobre a temática feminina/de gênero

As Mulheres e o Poder na Amazônia – Heloísa Lara Campos da Costa

Tráfico de Mulheres na Amazônia – Iraildes Caldas Torres e Márcia Maria de Oliveira

As Novas Amazônidas - Iraildes Caldas Torres

Mulheres jornalistas -  A grande invasão – Regina Helena de Paiva Ramos

O que é escrita feminina – Lúcia Castello Branco

O controle Social da Imagem da Mulher na Mídia – Mercedes Lima e Terezinha Vicente (Organizadoras)

História das Mulheres no Brasil – Mary Del Priore

O gênero nas Ciências Sociais – releituras críticas de Max Weber e Bruno Latour

 

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